GARANTIAS FUNDAMENTAIS Defensoria Pública deve proteger dignidade da pessoa
Nossa atual Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, estabelece logo em seu primeiro dispositivo que a dignidade da pessoa humana é fundamento do Estado brasileiro. Vejamos a origem deste precioso alicerce fundamental na história universal.
O antigo Código do rei sumério Hamurabi (1792-1750 ou 1730-1685 a.C.), fundador do primeiro Império Babilônico e unificador da região da crescente fértil conhecida como Mesopotâmia, a despeito de não enunciar um rol de princípios e de garantias fundamentais, em seu epílogo está escrito: “(…) Para que o forte não prejudique o mais fraco, afim de proteger as viúvas e os órfãos, ergui a Babilônia (…) para falar de justiça a toda a terra, para resolver todas as disputas e sanar todos os ferimentos, elaborei estas palavras preciosas (…)”.
O Livro do Êxodo, de autoria atribuída ao profeta Moisés, conta a libertação da escravidão e a saída do Egito do povo judeu, por volta da segunda metade do segundo milênio a.C.. Em seu capítulo 22, versículos 20-26, exprime a vontade de Iavé:
“Não afligirás o estrangeiro nem o oprimirás, pois vós mesmos fostes estrangeiros no país do Egito. Não afligireis a nenhuma viúva ou órfão. Se o afligires e ele clamar a mim escutarei o seu clamor; minha ira se ascenderá e vos farei perecer pela espada: vossas mulheres ficarão viúvas e vossos filhos, órfãos. Se emprestares dinheiro a um compatriota, ao indigente que está em teu meio, não agirás com ele como credor que impõe juros. Se tomares o manto do teu próximo em penhor, tu lho restituirás antes do pôr-do-sol. Porque é com ele que se cobre, é a veste do seu corpo: em que se deitaria? Se clamar a mim, eu o ouvirei, porque sou compassivo”.
O “Livro dos Provérbios”, uma das obras sapienciais do Antigo Testamento, escrito pelo rei Salomão (950 a.C.), no capítulo 25, versículos 21-22, conta a instrução deste soberano: “Se teu inimigo tem fome dá-lhe de comer; se tem sede, dá-lhe de beber: assim amontoas brasas sobre sua cabeça, e lave-te recompensará”.
Marcus Tullius Cicero, orador romano, em 52 a.C., em seu Tratado das Leis, assim se expressava em passagem desta obra:
“A semelhança entre os homens manifesta-se não só pelas qualidades, mas também pelos defeitos. Na verdade, todos se deixam atrair pelo prazer que, consistindo em atração viciosa, apresenta certa semelhança com um bem da Natureza; e sua delicadeza e suavidade seduzem e levam ao erro de tê-lo como um bem saudável e, por semelhante equívoco, fugimos da morte por tê-la como se fosse a dissolução da natureza e nos apegamos à vida, porque esta nos mantém no estado em que nascemos e temos a dor, por sua aspereza, como o pior dos males e por dar a impressão de conduzir à destruição da Natureza. E havendo entre a honra e a glória semelhanças, têm-se por felizes os que vivem entre honrarias e por infelizes os que permanecem no anonimato. Os desgostos, as alegrias, os desejos e os temores assaltam por igual a todos os espíritos, e, se as crenças de uns diferem das dos outros, aqueles que divinizam o cão e o gato o fazem inspirando-se na mesma superstição que atormenta todos os povos. Na verdade, qual a nação que não aprecia a cortesia, a amabilidade, a gratidão? Qual não despreza e odeia os orgulhosos, os maus, os cruéis, os mal-agradecidos? Tudo isso nos dá a entender que o gênero humano constitui uma só e única sociedade que seu progresso moral decorre do viver racionalmente”.
São Tiago, um dos doze apóstolos escolhidos por Jesus de Nazaré para segui-lo, encontrou o martírio sendo apedrejado até a morte, aproximadamente no ano 62, em sua Epístola defendeu:
“Meus irmãos, a fé que tendes em Nosso Senhor Jesus Cristo, glorificado, não deve admitir acepção de pessoas. Se, pois, em vossa reunião entrar um homem com anel de ouro no dedo e ricos trajes, e também, um pobre, com roupa surrada, e se dedicais atenção ao que está bem vestido, dizendo-lhe: ‘Senta-te aqui neste lugar confortável’, enquanto ao pobre dizeis: ‘Fica ali em pé’, ou então: ‘Senta-se aqui no chão aos meus pés’, acaso não estais fazendo distinção entre vós? E, não vos tornastes juízes de princípios injustos? Ouvi, meus queridos irmãos, escutai: Deus não escolheu os pobres deste mundo, para serem ricos na fé e herdeiros do reino, que prometeu aos que o ama?”
A carta ao pagão culto Diogeneto, escrita em meados de 120 ou 150 d.C., por cristão anônimo, em pequeno trecho dizia:
“Os cristãos não se distinguem dos demais homens, nem pela terra, nem pela língua, nem pelos costumes. Nem, em parte alguma, habitam cidades peculiares, nem usam alguma língua distinta, nem vivem uma vida de natureza singular. Nem uma doutrina desta natureza deve a sua descoberta à invenção ou conjectura de homens de espírito irrequieto, nem defendem, como alguns, uma doutrina humana. Habitando cidades Gregas e Bárbaras, conforme coube em sorte a cada um, e seguindo os usos e costumes das regiões, no vestuário, no regime alimentar e no resto da vida, revelam unanimemente uma maravilhosa e paradoxal constituição no seu regime de vida político-social. Habitam pátrias próprias, mas como peregrinos: participam de tudo, como cidadãos, e tudo sofrem como estrangeiros. Toda a terra estrangeira é para eles uma pátria e toda a pátria uma terra estrangeira. Casam como todos e geram filhos, mas não abandonam à violência os recém-nascidos. Servem-se da mesma mesa, mas não do mesmo leito. Encontram-se na carne, mas não vivem segundo a carne. Moram na terra e são regidos pelo céu. Obedecem às leis estabelecidas e superam as leis com as próprias vidas. Amam todos e por todos são perseguidos. Não são reconhecidos, mas são condenados à morte; são condenados à morte e ganham a vida. São pobres, mas enriquecem muita gente; de tudo carecem, mas em tudo abundam. São desonrados, e nas desonras são glorificados; injuriados, são também justificados. Insultados, bendizem; ultrajados, prestam as devidas honras. Fazendo o bem, são punidos como maus; fustigados, alegram-se, como se recebessem a vida. São hostilizados pelos Judeus como estrangeiros; são perseguidos pelos Gregos, e os que os odeiam não sabem dizer a causa do ódio. Numa palavra, o que a alma é no corpo, isso são os cristãos no mundo. A alma está em todos os membros do corpo e os cristãos em todas as cidades do mundo. A alma habita no corpo, não é, contudo, do corpo; também os cristãos, se habitam no mundo, não são do mundo. A alma invisível vela no corpo visível; Também os cristãos sabe-se que estão neste mundo, mas a sua religião permanece invisível. A carne odeia a alma, e, apesar de não a ter ofendido em nada, faz-lhe guerra, só porque se lhe opõe a que se entregue aos prazeres; da mesma forma, o mundo odeia os cristãos que não lhe fazem nenhum mal, porque se opõem aos seus prazeres. A alma ama a carne, que a odeia, e os seus membros; Também os cristãos amam os que os odeiam. A alma está encerrada no corpo, é, todavia, ela que sustém o corpo; Também os cristãos se encontram retidos no mundo como em cárcere, mas são eles que sustêm o mundo. A alma imortal habita numa tenda mortal; Também os cristãos habitam em tendas mortais, esperando a incorrupção nos céus. Provada pela fome e pela sede, a alma vai-se melhorando; também os cristãos, fustigados dia-a-dia, mais se vão multiplicando. Deus pô-los numa tal situação, que lhes não é permitido evadir-se”.
Santo Agostinho (Tagaste, 13 de novembro de 354 — Hipona, 28 de agosto de 430), doutor da Igreja Católica, nos oferecendo uma síntese de seu pensamento filosófico, teológico e político em sua obra A Cidade de Deus, no Livro XIX, capítulo 12, “Paz, Suprema Aspiração dos Seres”, redigiu:
“Quem quer que repare nas coisas humanas e na natureza delas reconhecerá comigo que, assim como não há ninguém que não queira sentir alegria, assim também ‘não há ninguém que não queira ter paz’. Com efeito, os próprios amigos da guerra apenas desejam vencer e, por conseguinte, anseiam, guerreando, chegar à gloriosa paz. E em que consiste a vitória senão em sujeitar os rebeldes? Logrado esse efeito, chega a paz. A paz é, pois, também o fim perseguido por aqueles mesmos que se afanam em demonstrar valor guerreiro, comandando e combatendo. Donde se segue ser a paz o verdadeiro fim da guerra. O homem, com a guerra, busca a paz, mas ninguém busca a guerra com a paz. Mesmo os que de propósito perturbam a paz não odeiam a paz, apenas anseiam mudá-la a seu talante. Sua vontade não é que não haja paz, e sim que a paz seja segundo sua vontade. Se por causa de alguma sedição chegam a separar-se de outros, não executam o que intentam, se não têm com os cúmplices uma espécie de paz. Por isso, os bandoleiros procuram estar em paz entre si para alterar com mais violência a paz dos outros”.